MARAVILHA DE CIDADE

No princípio do século passado ainda não havia Madona, mas o Rio da Nojeira já tentava dar palco para os artistas gringos. Não com o mesmo prestígio, é claro. Mas se o Rio ainda não fazia jus a idolatria que tem aos artistas, pelo menos fazia jus em ser a capital do país mais desgraçado do mundo, o Intankável Bostil! 

A francesa Sarah Bernhardt (1844-1923), uma das grandes atrizes do seu tempo, não recebeu nem de longe o mesmo cuidado que a Madona quando esteve no RJ, passando por maus bocados na "Cidade Maravilhosa". Sua estreia nos palcos bostileiros foi em 1886. As primeiras apresentações não animaram muito o público e uma delas acabou interrompida por uma briga na plateia - troca de carinhos é a marca registrada do povo Carioca desde sempre - além disso, seu filho foi espancado no hotel em que se hospedavam. Mesmo assim, retornou ao país em 1893, ocasião em que teve todas suas joias e dinheiros furtados - não foi do dia pra noite que o Rio recebeu fama de cidade de ladrões, são séculos de ladroagem - quando foi embora, ainda no Rio, o navio de Sarah foi bombardeado durante a Revolta da Armada - a característica tradição de ser um cenário de violência armada vitimando inocentes que o Rio tem não deixou de ser honrada até hoje. "Bateu de frente é só tiro, porrada & bomba", diria Valesca Popozuda - essa uma artista já bem brasileira e bem carioca.

Mas em 1906, Sarah, pressionada por seu empresário, retornou ao Esgotil. Durante a apresentação em um teatro da cidade, em uma cena na qual ela deveria se jogar de um parapeito sobre colchões que ficavam escondidos, acabou se estatelando no chão - um funcionário da casa, desavisado, havia retirado a proteção. Quem diria, o Brasil, o país dos desavisados, onde os funcionários "apenas cumprem ordens"? A grave contusão que sofreu a perna de Sarah não sarou jamais, e o membro teve que ser amputado anos depois por consequência disso.

                                    

Esta última passagem  de Sarah pelo Rio ainda rendeu zombaria por parte da imprensa, que escarneceu a falta de fortuna da moça. Mudam-se os atores e atrizes, os azarados e os sortudos, os que choram e os que riem da desgraça, mas uma coisa não muda, o Brasil continua sendo a intankável terra dos maus agouros e das tragédias desassistidas. 


 Adaptado de Almanaque de Curiosidades Históricas da RHBN - Março de 2013. 




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